quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Aguilar

    Já faziam aproximadamente seis meses que eu não entrava em casa. Estava morando na Alemanha e posteriormente viajando por diversos países da Europa, onde vi, sem dúvidas, as obras de arte e os lugares mais lindos da minha vida. Aquela sensação de casa, entretanto, já estava tão distante de mim e eu estava sentindo muita falta de não dormir em quartos grandes de albergues com no mínimo cinco estranhos ao meu redor.
    Quando cheguei em casa, corri por todos os cômodos e deixei por último a sala de jantar. Tudo parecia o mesmo, fora alguns detalhes como o chão encerado e os novos interruptores. Ao entrar na sala, porém, lá estava ele. Fui imediatamente cegada pelo vermelho abundante que se espalhava pelo ambiente e os riscos amarelos, brancos, verdes e azuis que o compunham de uma forma única e deslumbrante. Me senti como se anestesiada não só com o novo quadro do Aguilar adquirido enquanto eu viajava, mas com o lugar onde ele estava colocado e como ele pertencia àquela sala e àquela parede.
    O reflexo dele na mesa preta de vidro logo a frente tornavam o quadro eterno, os livros, as paredes brancas e a sobriedade da decoração completavam e exaltavam a magnificência dele, as rosas laranjas colocadas à frente dele davam o toque final da beleza em sua plenitude. A admiração que eu senti foi tão grande que chegou a cessar com a angústia de voltar para o Brasil e para a inacessibilidade que eu estava sentindo naquele momento.
    O fascínio do momento me acompanha até hoje quando entro na minha sala e vejo o quadro, capaz de me acalmar e de me inspirar em fases de bloqueios criativos, sua beleza é interminável, assim como as sensações que ele me traz toda vez que o olho.

                                                                            Por Maria Carolina Starzynski Bacchi




                                 

A Arte de Atuar.


Atuar.

A arte de atuar me encanta. Você ter a oportunidade de viver várias vidas durante uma unica vida é fascinante. Foi por esse motivo que escolhi essa parte de minha vida para usar como experiência estética.
Toda criança já sonhou em ser médico, professor, cantor, dentista entre outros, e durante toda a sua infância brinca de ser outra pessoa, essa é a melhor parte de ser criança. No entanto toda criança cresce e deve escolher uma carreira só, deve escolher ser uma pessoa. Que pessoa ser? Que profissão escolher? Você não sabe, você quer tudo. Quer ser músico, professor, dentista... e mais, não quer parar com a brincadeira.
Então porque não ser tudo ao mesmo tempo. Porque interromper essa brincadeira tão gostosa. Seja ator.
E foi isso o que eu fiz, me tornei atriz. Tive muitos personagens, muitas vidas, mas uma personagem me marcou e me encantou de uma maneira tremenda. Essa foi Dolores Duran. Uma cantora e compositora incrível. Mulher de uma vida espetacular, que já enfrentou problemas de todos os tipos, e não resistiu.
Interpretá-la foi algo muito difícil, pois nós duas não temos nada em comum a nao ser a fé no amor e a paixão pela música. E foi baseado nisso que estudei muito e montei um espetáculo inspirado na vida dessa mulher.
Chegou o grande momento. Toca o terceiro sinal e o público entra, o nervosismo toma conta de meu corpo, mas quando aquela luz vermelha aquece meu corpo e as primeiras notas de a noite do meu bem (música de autoria de Dolores) começam a tocar e eu canto os primeiros versos tudo muda, pois quem está lá não é mais a Nathally e sim Dolores que renasce em meu corpo. Consigo enxergar no olho das pessoas da platéia a emoção e satisfação de ver essa estrela revivendo no corpo de uma jovem atriz.
A brincadeira continua e continuará sempre sendo no cinema, no teatro ou na fotografia, não importa. A garota que não sabia o que escolher foi escolhida pela arte, pela vida e pela magia.

Nathally Ap. e Silva

Bung Jump na Nova Zelândia.





        A experiência estética que escolhi é o video do bung jump que fiz na Nova Zelândia. Morei na Austrália por um ano e meio e desde o momento que decidi fazer o intercâmbio já pensava em ir para Nova Zelândia só para pular de bung jump.
       Todo mundo sempre me dizia que era melhor eu primeiro ver a altura e depois falar que iria fazer, mas não eu estava decidida. Quando fui para lá, fui ate o lugar que compra o pacote para pular, mas o lugar que compra é em uma loja no meio da cidade e não da para ver o local aonde vai pular. Logo que comprei veio um ônibus e me levar para um lugar a uns 20 minutos da cidade, no qual passa por uma serrinha terrível que olhando para um lado é precipício e tive a infelicidade de sentar na janela. A estradinha até o local é super estreita.
      Quando cheguei ao local coloquei o equipamento de segurança e sai para ver a altura, é aterrorizante, muito muito muito alto, por isso que é o segundo maior do mundo. A plataforma fica no meio de um vale muito bonito. Mas para chegar até a plataforma tem que ir com um "bondinho" aberto e com o chão de vidro, que fica balançando com o vento. Na hora não sei dizer a minha sensação. Ao mesmo tempo que estava supera animada e abismada com a beleza do lugar, um medo enorme ia crescendo dentro de mim.
      Chegando na plataforma, o medo começou ser incontrolável. Estava com dois amigos que pularam na minha frente e voltavam falando que foi a melhor coisa que fizeram e que fariam de novo com certeza. 
E então chegou a minha vez, o moço de la me explicou como seriam os procedimentos e me encaminhou para a ponta da plataforma. No momento que olhei para frente vi em belo vale com um rio em baixo com uma beleza indiscritível, mas no memento que olhei para baixo vi a altura e essa beleza toda se transforma em absolutamente nada. 
      O moço contou até 3 e seria o momento para eu pular, mas não, não consegui e pedi para recomeçar a contagem. Nesse momento ele me da um ótimo conselho: " Pula como se voce estivesse pulando em uma piscina rasa". Ok, olhei para baixo e pensei " Esse cara só pode estar completamente maluco, como ele quer que eu pule no meio do nada, achando que é uma piscina rasa, sendo que eu nem tenho tanta confiança assim nessa cordinha!". 
     Mas assim que começou a contagem novamente decidi que se não pulasse na hora iria desistir e simplesmente pulei.
     Com certeza foi a melhor sensação que já senti, é uma sensação de liberdade. Começou a passar milhões de coisas pela minha cabeça, a paisagem se torna incrível, e ai tive a certeza que foi a melhor coisa que poderia ter feito e no melhor lugar.
     Quando voltei para a plataforma ainda estava meio atordoada, pois o medo que senti foi enorme, mas a sensação que senti supera qualquer medo.
     Conto isso hoje e ainda  posso sentir toda a mistura de sensações que senti, tenho certeza que ficará para sempre na minha memória.

     Bom essa foi minha experiência estética.

                                                                                                                           Jessica Bauab

Foo Musique


Sempre fui ligado a música e ao rock, isso vem do berço pelo gosto e profissão dos meus pais. Nasci em uma época onde o rock já estava começando a perder força, a música electronica e o rap estavam cada dia mais maiores, mas ainda não eram péssimas composições como hoje é o sertanejo e o pop das rádios.
A música faz os problemas desaparecerem, ou pelo menos serem menores, além de trazer uma questão de construção de personalidade muito grande, podendo ser importante em toda a forma que sua vida seguirá, os amigos que vai conhecer, com quem vai se identificar, o lugar que gosta de frequenter e a pessoa que vai amar.
A minha primeira paixão musical dentro do mundo do rock foi uma banda do estilo grunge chamada Nirvana. Ela proporcionou um estilo de vida que anexou a música e o skate como gostos fortes para mim. Havia apenas um problema, eu nunca poderia ver essa banda ao vivo, o fato é que eu nasci em 1992 e o vocalista da banda Kurt Cobain se suicidou em 1994, quando eu tinha apenas 1 ano e 10 meses de idade.
Muitas bandas seguiram com influências deixadas pelo Nirvana, mas uma era em especial, a banda formada pelo próprio ex-baterista do Nirvana Dave Grohl em 1995. Após descobrir ela direito com meus 11 anos de idade, sempre sonhei e pensei em estar em um show dessa que teria o ultimo resquício vivo do antigo Nirvana, o nome dessa banda é Foo Fighters.
Uma banda que lançou 7 CDs e que teve presença marcante na minha vida, relacionamentos, vontades, sonhos e momentos. O desejo de ver a banda ja estava um pouco apagado, pois não havia nem especulações dela fazer um show no Brasil por anos e anos.
Foi então que aconteceu, após muitos manifestos de fãs brasileiros a banda confirmou um show para o dia 7 de abril de 2012 na cidade de São Paulo, em um festival chamado Lollapalooza. Depois de 17 anos de banda eles viriam finalmente para a América do Sul. Quando soube do caso era outubro do ano passado, 2011, enquanto eu assistia ao vivo a comissão de imprensa do festival, e a partir dai começaram as preparações.
          Todo dia ouvia alguma coisa, seja do Foo Fighters ou do Nirvana, procurava informações do show e via outros concertos feitos pore eles em outros paises. Conforme foi chegando perto a ansiedade aumentava. Por sorte minha mãe trabalha na área e quando chegou o convite especial para o festival, possuía uma pulseira prateada que permitia a entrada no camarim e assistir o show praticamente do palco.
Mesmo antes de acontecer eu já estava feliz e satisfeito, contente por ter escolhido esse gosto musical que mudou muitas coisas na minha vida, tracei um caminho que não me arrependo e me orgulho muito, sou quem eu sou e tudo que fui na vida forma a minha pessoa e meu caráter hoje.
E chegou o dia que eu contei os minutos e os segundos para chegar, a caminho do festival o cd tocava Foo Fighters, e a energia do dia era regada pelo rock, eu senti algo muito bom e forte.  A área do camarim do Foo Fighters em especial estava impossibilitada de entrar, mas muitos músicos de outras bandas circulavam pela área dos camarins. O mais próximo que consegui foi um autografo do tecladista de turnê da banda, o unico membro que saia do camarim, mas mesmo assim eu estava satisfeito, estar lá era um sonho e o que estava por vir era inimaginável.
Eram 21:30 quando o show começou, eu e um amigo estavamos na boca do gol, quase dentro do palco vendo o show como poucos puderam ver. 70 mil pessoas em delírio e uma emoção e energia que talvez eu nunca tinha sentido antes. Cada música me lembrava uma época da minha vida, um momento ou até uma pessoa.
Foram três horas seguidas emocionantes e únicas, fazendo com que eu ficasse realizado, ligando a minha primeira grande banda favorita Nirvana com o Foo Fighters e passando por lembranças e memórias que formam o que eu sou e quem eu sou.
A música é incrível por infiltrar seus pensamentos e sentimentos de um modo que você não imagina. É bonito cultivar isso, e não ser regido pela moda onde uma música não é mais “legal” porque ela é de 1 ano atras.

Show do Foo Fighters no Brasil 07/04/2012

"What have we done with innocence
It disappeared with time
It never made much sense
Adolescent resident
Wasting another night on planning my revenge"
(Monkey Wrench – Foo Fighters)

                                                                                        Antonio Curti.

Um novo mundo...

        Por trás das cortinas fechadas, faltando poucos minutos para o início, todos se movimentam rapidamente, em um ritmo que parece inalcançável. Vestidos, sapatilhas, maquiagens, cabelos, fitas, grampos, laços, tudo é conferido em todos, enquanto o cochicho da platéia aos poucos vai aumentando. Um círculo é formado, damos as mãos, fechamos os olhos, e o ano passa em nossas mentes como um filme. Cada movimento, cada giro, cada suor, cada lágrima derramada devido ao fracasso, ou ao cansaço, cada último fôlego tomado para uma outra tentativa, cada sorriso, cada alegria que toma todo o seu corpo, por causa do acerto de um simples exercício. Aquele sentimento cresce, apertamos as mãos mais fortemente, esperando as últimas palavras que nos levará para o momento mais esperado. Soltamos as mãos. Cada um vai para o seu lugar, as luzes da platéia se apagam, as do palco se acendem intensamente, as cortinas se abrem, e começamos a dançar de acordo com a música que toca ao fundo. Entramos em transe total, passamos para um novo mundo, e é como se não existisse vida fora daquele teatro. E toda troca de roupa parece ser uma injeção de adrenalina, que faz toda aquela sensação crescer, não percebemos o tempo passar, nem o que acontece a nossa volta, já que retornar ao palco é tudo o que importa naquele minuto. O fim se aproxima, as horas se tornaram segundos, e aquele último aplauso da platéia é como um despertador, que nos acorda e tenta nos trazer de volta do melhor sonho. Damos as mãos novamente para agradecer, sendo esse um último ato de desespero para que não acabe. Nos agarramos aqueles segundos finais com todas as forças, mas não tem jeito, todas as luzes finalmente se acendem, é possível reconhecer cada rosto presente no andar debaixo do local, e não podemos mais fingir ou tentar fugir... estamos de volta!
                                                                                        

                                                                                         Julia Prados

Vazios e sombras


Confesso que quando penso em uma experiência estética não me vem a mente de imediato algo com contornos bem definidos. Estaria mentindo, ou talvez exagerando, se falasse de uma maior experiência estética. Elas tem uma certa presença intermitente na minha vida e sua natureza aparentemente aleatória ainda é um mistério.

Me lembro, a pouco tempo, de ter me emocionado observando de longe um apartamento vazio, que, por algum motivo, parecia expressar o vazio que todos em algum momento sentimos. É difícil expressar o que me tocou naquela imagem, posta dessa maneira simplista corre o risco de parecer trivial. Talvez não seja tanto o prédio em si, mas meu olhar naquele momento, que permitiu que ele comunicasse comigo daquela maneira. Havia ali uma forca da luz, compondo uma atmosfera, desenhando as sombras e alterando o contraste das cores provocando sensações de natureza misteriosa.

No cinema apenas impressão de luz e sombra dos objetos na película nos permite projetar as imagens mesmo depois dos cenários desfeitos, a memória opera de maneira semelhante.
O que me emocionou no predio não só no vazio, mas na ausência que esse vazio pressupõe. 


Luta.


Ato I
Antes de entrar em cena, os protagonistas passam por um severo ritual, repleto de tradições milenares. O ato, reproduzido tantas vezes antes, ainda não perdeu sua relevância. A mente sã, pura e livre de qualquer pensamento turvo e atordoado é fundamental para a realização artística que virá a seguir. Sendo assim, o equilíbrio mental é de suma importância para os protagonistas, tendo ambos passado por diversas preparações psicológicas antes de estarem prontos para entrar em cena. O físico é também essencial, não apenas a boa forma, mas a respiração, a postura, e muitos outros elementos que condicionarão a eficácia de suas expressões corporais. 
O palco está montado. 
Os passos que se seguem até a arena, se tornam mais lentos do que o esperado: o tempo e espaço parecem se estender no momento em que todos os olhares contemplativos se voltam aos protagonistas. É possível sentir os batimentos cardíacos ecoando por toda a dimensão corporal, como se todos os rostos e corpos que ocupam aquele ambiente pudessem sentir o sangue pulsando em suas veias. No entanto, uma vez que a performance se iniciará em instantes, é necessário esvaziar a mente, retomando o domínio total sobre seu próprio corpo.  É o corpo o principal veículo desta arte.
O sinal é dado para que a luta comece.
Foi só após vivenciar minha primeira luta no ringue, que pude perceber que esta havia sido uma experiência estética. Sim, estética. A luta, diferente do que muitos pensam e poucos se lembram, é também uma forma de arte. É uma forma de arte, tanto quanto a dança ou peça de teatro. No instante em que a luta se inicia, o corpo busca em sua forma mais natural, atingir a perfeição da expressão artística estudada. A luta, exige estudo. A técnica milenar, passada de gerações por gerações, só é verdadeiramente compreendida, através do domínio de sua técnica, de suas peculiaridades, de sua beleza. 
O que realmente é o belo?
Onde se encontra a real essência da beleza? O que pode ou deve ser considerado como arte nos dias de hoje? Aquilo que remete aos nossos estereótipos de belo? Toda e qualquer “obra de arte” exposta em galerias aleatórias ao redor do mundo, deve ser tomada, inquestionavelmente, como uma forma de arte? É o valor atribuído à determinado objeto que condiciona e define seu status artístico? Não sei responder, ao certo, essas questões. Porém, o que se tornou claro, após minha experiência ao lutar, é que a convicção de que existe beleza na arte do combate corpo a corpo, era mais do que compreensível. A luta é sim uma arte (não é atoa que se chama também Artes Marciais). Sua beleza consiste na busca da perfeição em cada movimento. A violência é mera consequência dessa arte. Não devemos nos esquecer de que existem diversos quadros, filmes, fotos, peças, livros. repletos de agressividade, tão brutais ou mais que os resultantes de uma luta física.


A beleza não está no objeto observado e nem em quem o observa.
Quando me dei conta do belo que há na luta, era tanto espectador quanto o próprio observado. Cada movimento feito pelo companheiro de luta, refletia nos meus. Estava simultaneamente em estado contemplativo, sem julgamentos efetivos sobre o que outro fazia, receptiva a inúmeros sentimentos gerados pelos golpes diferidos em mim, e, de certa forma, me moldando e determinando meus passos seguintes dependendo daqueles analisados anteriormente. Para aqueles que não compreendem essa forma de arte, tudo acontece em um ritmo frenético e aleatório. Porém, é visível para os apreciadores, a complexidade por de trás de cada olhar, jogo de quadril, golpe e até mesmo a dedicação que há em cada respiração.
A paixão por esta arte, só se concretizou a partir dessa singular experiência. Foi no momento em que eu vivi novas sensações e me livrei da subordinação de qualquer tipo de conceitos morais e me deixei simplesmente contemplar minha própria luta, que enxerguei a pura beleza artística que existe nas artes marciais.

Adriana Gaspar

Um solo sem uma base


Um dia meu irmão me contou a pior coisa que se pode ouvir.
Entrei naquele quarto e fingi que nada estava acontecendo. Mas como mentir algo tão serio para o próprio pai? Era obvio que ele já sabia. Ninguém havia falado nada, mas ele sabia.
Segurei o choro e lhe dei um abraço como sempre fazia ao chegar naquele quarto.
Lembro de segurar aquela mão quente e aconchegante, aquela mão calejada de uma vida inteira de muito violão. Passei horas assim, apenas conversando. Ouvir aquelas palavras que ele dizia; palavras que não voltam mais.
Ele fazia graça e tentava me distrair, pedindo pra tirar fotos engraçadas e fazendo caretas. Em nenhum momento demonstrou o que sentia, nunca admitiu nada. Queria sempre nos deixar mais tranqüilos.
Por dentro era tudo confusão, mas por fora só se via paz e tranquilidade.
Parecia que ele sentia mais curiosidade do que medo; curioso com o que iria acontecer,  com o que iria sentir.
Passei muito tempo naquele quarto. Curtindo coisas que eu sabia que não poderia curtir mais. Naquele momento, queria mais do que nunca dois violões para poder tocar algumas musicas com ele.
Mas conforme passaram-se as horas, não aguentei. Era um pensamento muito impossível na minha cabeça, não podia ser verdade, não podia acreditar, não queria acreditar. Tive que sair daquele quarto.

Nesse instante, vi meu pai tocando violão em casa; vi o momento que pedi para me ensinar a tocar minha primeira musica.
Me vi sentado na sala treinando aqueles três acordes,  me perguntando se um dia eu iria conseguir tocar que nem ele.
Lembrei dos inúmeros momentos em que disse que estava orgulhoso de mim.
Vi então o show dos meus irmãos; estávamos em uma pequena cidade do interior. Meu pai era famoso naquela cidadezinha, todos conheciam suas musicas. Chegou então o momento. Meus irmão o chamaram para subir ao palco e tocar sua musica. Era praticamente um hino para aquela cidade.  Eu o olhava com muito orgulho.
Foi então que meus irmão sorriram, e meu pai olhou para mim e disse: “Filho, vem tocar!”
Nervoso, subi ao palco, sorrindo como nunca havia sorrido antes. O lugar estava lotado. Começamos a tocar. Lembro de ver meu pai botando todos pra pular e cantar junto. Estava realizando um sonho.
Foi incrível, um dos melhores momentos da minha vida.

Um pequeno sorriso apareceu no meu rosto. Limpei as lagrimas, respirei fundo e resolvi voltar. Não podia deixa-lo tocar essa musica sozinho.
Ao entrar naquele quarto, olhei para ele, mas ele não olhava mais pra mim. Segurei sua mão, ele apertou de volta , me mostrando que ainda estava lá. O abracei com cuidado.
Lhe contei em seu ouvido quais seriam as próximas canções. Os próximos shows.
Queria muito ouvir um único som, mas as cordas já estavam enferrujadas e desafinadas. Tive que tocar sozinho. Falei tudo que tinha pra falar. E sua mão sempre apertando de volta para me dizer que a musica não havia acabado.
Ele parou de apertar, mas eu não parei de tocar.
Percebi que essa era a ultima musica, e que dessa vez não haveria bis.
Fiquei forte, até o fim do pior show da minha vida.
Ele abriu os olhos uma ultima vez. Aqueles olhos grandes e verdes, que já não olhavam mais pra lugar nenhum. Meu pai tocou sua ultima nota.

A grande musica meu pai havia ensinado todas os acordes, mas o solinho agora eu teria que aprender sozinho. O problema é que meus dedos estavam todos quebrados, e eu teria que aprender as notas mais uma vez.

Tenho agora que fazer o solo sem a sua base...




Pedro Pinheiro

Cliques

A experiência estética que escolhi compartilhar é a de ser fotografada. Não alguma situação específica mas a sensação de todas as vezes em que os cliques da câmera me mostram uma nova perspectiva, uma nova realidade.
Lamento não ser uma experiência tão interessante ou tão bonita quanto outras que possam ter vivido, mas a subjetividade dessa, pra mim, é tão intensa que se eu abordasse outro assunto estaria anulando uma experiência contínua na minha vida que dá sentido à minha realidade.
Às vezes sou mãe, sou filha, sou namorada, sou a amiga, sou mulher, sou menina. Cada personagem que sou me dá novo fôlego, me mostra uma nova perspectiva de realidade, de pensamentos, de ações. Cada personagem sou menos eu e mais envolvimento, penso menos em mim e mais no momento.
Momento vivo e presente que revivo a cada trabalho, uma nova experiência que não se limita ao presente finito, mas ao presente eterno em pensamento e sentimento.
A luz montada clareia a vontade de ser, de viver. 
A imaginação flutua nos poucos segundos de espera.
Então conexão entre os companheiros de trabalho vai acontecendo e a cada sussurro ou grito tenho mais atenção e foco para que o corpo obedeça e a mente flutue até um lugar de onde não vai voltar até a sessão acabar.
Em cada movimento o sentimento esmaga a razão petrificada sem a consciência de que a fez. 
Cada clique a realidade muda, o clique é a chave, o clique é o clímax, o clique traz vida, o clique exige vida.
Enfim o corpo exausto, a mente regozijando a beleza não visual da experiência vivida e a satisfação que invade a alma.
O que resta após as luzes serem apagadas, os fios recolhidos, a maquiagem tirada, o figurino desmontado e as companhias  distantes é a conversa com o eu e o novo eu.






Gabriella Albino